“Deve haver uma valorização dos sinais que o doente transmite ao médico, mas que nem sempre são demonstrados nas análises clínicas”

Ana Sampaio tem 44 anos, é presidente da Associação Portuguesa de Doença Inflamatória (APDI) do intestino e portadora de doença de Crohn. Diagnosticada em 2000, há já 18 anos que (con)vive diariamente com esta doença que, para além de limitar a sua qualidade de vida, induz um conjunto de comorbilidades, entre as quais a anemia.

RAIO-X (RX) – Quais foram os principais sintomas que deram o alerta para a doença de Crohn?

Ana Sampaio (AS) – Inicialmente comecei por sentir um cansaço excessivo aliado a algumas diarreias. Depois tornou-se mais evidente quando incharam os joelhos e os cotovelos. Aí, o médico disse que tínhamos de estudar melhor o que se estava a passar porque já eram muitas alterações.

RX – De que forma é que esta doença compromete a sua qualidade de vida?

AS – Atualmente, a doença já não compromete muito a minha qualidade de vida, mas já comprometeu. Os portadores de doença de Crohn ora estão em crise, ora estão bem e acabam por ter de gerir ambas as situações. Quando fui diagnosticada estava a passar por um período critico, de crise – entre operações a absessos anais e exames – e aí senti-me altamente comprometida, nomeadamente, a nível profissional. Cheguei a estar seis meses de baixa para conseguir superar essa crise. No entanto, não deixei de fazer praticamente nada na minha vida. A grande condicionante foi mesmo a atividade física, que deixei completamente de lado por incapacidade para a realizar. Há cerca de um ano tive uma nova crise, que implicou uma série de cuidados, a realização de novos exames e abrandar o ritmo profissional. Dei início à terapêutica com medicamentos inovadores que, hoje em dia, me permitem ter qualidade de vida.

RX – O que é que sentiu quando foi diagnosticada?

AS –  Foi um choque, fiquei afetada psicologicamente. O diagnóstico da DII é feito quando estamos em crise, que é a fase mais complicada da doença e muitas vezes, é difícil pensar que o resto da vida não vai ser assim. Tinha 26 anos quando fui diagnosticada e não foi fácil perceber que sofro de uma doença que me vai acompanhar para o resto da minha vida. Naquela altura, temos a ideia de que ainda há muito para viver, e efetivamente há, e acaba- mos por começar a questionar como é que vai ser a nossa vida dali para a frente.

RX – Sendo a anemia uma das comorbilidades desta doença, costuma ser avaliada face a este parâmetro?

AS – Sim, normalmente nas análises clínicas avaliam a anemia. A grande dificuldade no diagnóstico da anemia é transmitir, aos médicos, que sofremos de um cansaço que não é normal e que é visível em coisas tão simples como acordar de manhã e não ter vontade, nem forças para levantar da cama ou até não conseguirmos estender a roupa ou subir uma rua com muita inclinação. Há alguns esforços que exigem um pouco mais de nós, e como já estamos cansados, tememos não conseguir estar à altura.

RX – Como é que é corrigida a anemia em doentes com patologia inflamatória do intestino?

AS – A anemia é sempre corrigida através da medicação. No entanto, na DII a absorção gastrointestinal está comprometida o que condiciona a terapêutica oral. Ou seja, para além da toma não ser agradável porque mexe com a parte intestinal, acaba também por não fazer efeito porque o nosso organismo não absorve.

RX – Considerando esse compromisso da absorção gastrointestinal inerente a doença inflamatória do intestino, qual é que é a opção a considerar como terapêutica?

AS – A suplementação intravenosa é, sem dúvida alguma, a opção mais viável nestes casos. Quando estamos em crise, provavelmente, é mesmo a única solução que temos. Tomar medicamentos que depois não vão ser absorvidos pelo intestino não nos traz benefício nenhum. E aí, surge a necessidade da terapêutica via intravenosa para que o nosso corpo absorva o ferro adicional que nos está a ser administrado para que possamos recuperar de forma favorável.

RX – Que mensagem gostaria de deixar aos portadores de doença inflamatória do intestino e aos profissionais de saúde, neste dia da anemia?

AS – A mensagem que eu quero deixar é que não é normal estar cansado, portanto, se as pessoas se sentem muito cansadas, devem transmitir essa ideia ao médico. Muitas vezes, os médicos desvalorizam, dizendo que “cansados, todos nós andamos”, mas não é bem assim. Quando atinge um ponto de cansaço sob o qual não conseguimos subir uma subida ingreme há realmente algo que não está bem, alguma coisa se passa com o nosso corpo. E é essa ideia que deve ser transmitida ao médico – eu fazia e agora não consigo fazer – para posteriormente se possa avaliar essa situação. O conselho que dou aos profissionais de saúde, aos médicos em particular, é que estejam atentos e sobretudo que escutem o doente. Ouvir todos ouvimos, mas nem sempre todos escutamos. Deve haver uma valorização de certos sinais que o doente transmite aos médicos porque os sente, mas nem sempre são demonstrados nas análises clínicas.

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