Dia Mundial da Luta Contra o Cancro: Afinal, qual a origem genética do cancro da mama?

No Dia Mundial da Luta Contra o Cancro, que se assinala a 4 de fevereiro, o Raio-X entrevistou Ana Teresa Maia, cientista e professora universitária na Universidade do Algarve que, desde 2014, tenta responder à mesma pergunta que dá título a esta entrevista: “Afinal, qual a origem genética do cancro da mama?”. Em Portugal, anualmente, são detetados cerca de 6.000 novos casos de cancro da mama e 1.500 mulheres morrem com esta doença e por isto, nas palavras da investigadora, “neste dia devemos lembrar o quão comum é o cancro e que muitas das causas são evitáveis. Motiva-me estudar as causas genéticas, porque são estas que, para já, não conseguimos prevenir, mas as causas evitáveis também são importantes: as ambientais, o tabagismo e o álcool, por exemplo, são os maiores contribuidores para o aparecimento do cancro e são reversíveis e por isso as pessoas devem estar sensibilizadas para elas.”

Ana Teresa Maia foi uma das premiadas da primeira edição da Maratona da Saúde, em 2014, onde recebeu 25.000€ para o desenvolvimento do seu estudo: “À descoberta da importância da cis-regulação na suscetibilidade do cancro da mama” e que brevemente irá apresentar quais os resultados obtidos.

Raio-X (RX) – Voltando atrás no tempo, quando foi uma das premiadas na primeira edição da Maratona da Saúde, em 2014, quais foram as motivações para pensar neste estudo e querer desenvolvê-lo?

Ana Teresa Maia (ATM) – Este estudo é a continuação de um trabalho que eu iniciei em 2003. Depois do meu doutoramento em Londres ingressei depois na universidade de Cambridge, onde iniciei um pós-doutoramento sobre cancro da mama e risco genético e o trabalho que eu desenvolvo agora em Portugal provem daí. Já o desenvolvo a mais de uma década. O nosso interesse é tentar identificar na população em geral quais é que são as mulheres que estão em maior risco para cancro da mama; isto porque, este cancro – e não é que todos o sejam – mas muitos se forem identificados precocemente são mais fáceis de tratar, e, portanto, a paciente sofrerá menos e morrerá menos, e é esse o objetivo sempre de quem trabalha nesta área do risco genético: identificação na população das mulheres que devem ser seguidas mais de perto. Sabemos que estão em alto risco e por isso é importante segui-las.

RX – Há algo que a motiva, em especial, a estudar o cancro da mama?

ATM – O cancro da mama é um cancro muito comum e que existe na minha família. Não na família mais próxima, mas existe um ramo da minha família que tem cancro da mama. O cancro em si porque é uma doença fascinante, é diferente em cada pessoa, e isso fascina-me: conseguir perceber como é que as nossas células se podem alterar de tal forma que se matam a si próprias, porque o que o cancro faz é “matar o hospedeiro”. Interessa-me conseguir perceber as mudanças genéticas que ocorrem, mas existe também um lado pessoal na minha motivação, um lado humano. Gosto de fazer ciência que eu acredite que um dia vá salvar alguém. Como costumo dizer aos meus alunos, se eu souber que o meu trabalho no final de tudo, no final da minha vida ou da minha carreira, tiver salvo uma mulher de ter morrido de cancro da mama, eu iria considerar que a missão foi cumprida. Esse é o objetivo humano da nossa investigação: tentar que a doença não seja tão grave que consiga matar.

RX – E como querem conseguir essa redução de mortalidade?

ATM – Identificando as mulheres em mais alto risco, para as podermos rastrear mais frequentemente e descobrir a sua doença numa fase mais inicial, mais tratável e menos agressiva para a paciente.

RX – Têm estudado as características genéticas que levam a desenvolver o cancro. Estão a desenvolver mapas genéticos com essas características?

ATM – Eu costumo dar o exemplo da autoestrada: todas as nossas células têm o mesmo ADN, a mesma informação; nós, investigadores, olhamos para o genoma (a informação presente no ADN) como se fosse uma autoestrada enquanto procuramos os marcos que nos devem deixar alerta. Ou seja, tentamos identificar os marcos que, mais frequentemente, aparecem nas mulheres que têm cancro da mama, que são os biomarcadores. São as bandeirolas do risco: dizem-nos que aqui, esta zona, está associada ao risco, há algo genético que faz uma pessoa ser mais predisposta para o cancro. Tentamos então identificar exatamente o maior número possível de regiões do genoma que estão associadas ao risco para depois podermos fazer testes, que eventualmente consigam ser aplicados na prática clínica, para que um dia uma mulher saudável pergunte: quantas bandeirolas de risco tenho eu? Isto poderá significar que ou ficamos mais atentos àquela paciente ou até mesmo que ela poderá ser poupada a fazer tantas mamografias.

Depois, o que é mais central, ainda sobre o prémio Maratona da Saúde, é: tendo nós identificado já alguns biomarcadores (no nosso trabalho e no trabalho de outros colegas) é perceber, mas porque? Porque é que aquela região do genoma, quando está assim, faz com que aquela pessoa tenha um risco maior? Fazemos o que se chama de estudos funcionais, em que vamos à procura da função e este é exatamente o foco do meu prémio ganho em 2014: olhar para a função de vários biomarcadores que nós já sabíamos serem de risco.

RX – E o objetivo no futuro será qual?

ATM – O objetivo seria um dia – apesar da janela de aplicabilidade ser de alguns anos – indicar aos colegas que estudam drogas para o cancro: quando este gene está ligeiramente mais expresso nas mulheres que têm cancro, eventualmente, podem-se realizar tratamentos de prevenção. Ou seja, esta mulher tem este gene aumentado e por isso vai tomar este medicamento para baixar os níveis e reduzi-los ao normal, para que o risco de desenvolver cancro da mama possa baixar.

RX – O que descobriram até agora?

ATM – Na altura do prémio Maratona da Saúde nós estávamos a avaliar a função de marcadores já existentes e agora estamos muito focados em contribuir para a identificação de novos marcadores, que são centenas. E enquanto não soubermos todos, não temos uma avaliação completa do risco.

 

Por Margarida Queirós com fotografia de Daniel Pina

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