Francisco George: “Não sabemos, nem podemos medir a evolução do suicídio em Portugal”

Contrariando as notícias que dão conta de um aumento significativo da taxa de suicídio em Portugal, o Diretor-Geral da Saúde reforçou, na passada quinta-feira, no âmbito da apresentação do Relatório Saúde Mental em Números 2015, que não é possível fazer comparações entre os números anteriores a 2014 e os atuais. A subnotificação do suicídio no certificado de óbito em papel é, segundo Francisco George, a causa do “enviesamento” dos dados

“Não temos condições para avaliar tendências porque, até 2014, no certificado de óbito em papel, assinado pelo médico, o suicídio era subnotificado, muitas vezes por pressão da família”, afirmou Francisco George. Desde então que a introdução do certificado eletrónico reduziu a subnotificação, permitindo traçar um retrato mais rigoroso e mais imediato sobre os verdadeiros números do suicídio.
“Sabemos que tínhamos cerca de 1000 casos/ano e que agora terão sido registados um pouco mais de 1000 casos/ano, mas isto não significa que houve mais suicídio, significa que foram notificados mais casos”, explicou o Diretor-Geral da Saúde, adiantando que “em termos matemáticos, não conseguimos ainda encontrar uma fórmula capaz de corrigir este enviesamento”.

Financiamento insuficiente e baixa prioridade política

Relativamente ao relatório da DGS, Saúde Mental em Números 2015, verifica-se que as perturbações mentais e do comportamento mantêm um peso significativo no total de anos de vida saudável perdidos pelos portugueses, com uma taxa de 11,75% contra 13,74% das doenças cerebrovasculares e 10,38% das doenças oncológicas. Simultaneamente, as perturbações mentais representam 20,55% do total de anos vividos com incapacidade, seguidas pelas doenças respiratórias (5,06%) e a diabetes (4,07%).
“Fruto das políticas de desinstitucionalização dos doentes e do desenvolvimento de cuidados na comunidade, o número de camas em hospitais psiquiátricos tem vindo a diminuir para o número atual de 5,5 por 100 000 habitantes, assim como a sua área de intervenção”, referiu Álvaro de Carvalho, frisando que tal se deve à criação de Unidades Locais de Saúde Mental. “Desde 2011 que encerraram três dos seis hospitais psiquiátricos do país”, lembrou o diretor do Programa Nacional para a Saúde Mental.
No entanto, “a centralização de recursos, a falta de formação profissional, a insuficiência de financiamento e baixa prioridade política mantêm-se como as principais barreiras ao processo de transição dos cuidados de base hospitalar para os cuidados na comunidade, modelo previsto na Lei da Saúde Mental em vigor”.
Num breve comentário a este relatório, Fernando Araújo reconheceu que, apesar dos avanços conseguidos na área da saúde mental, “continua a haver dificuldade de acesso a respostas, nomeadamente ao nível dos Cuidados Continuados e Integrados, bem como a necessidade de reforço de camas para a Pedopsiquiatria e assimetrias na distribuição dos profissionais”.

“Fruto das políticas de desinstitucionalização dos doentes e do desenvolvimento de cuidados na comunidade, o número de camas em hospitais psiquiátricos tem vindo a diminuir para o número atual de 5,5 por 100 000 habitantes, assim como a sua área de intervenção” Álvaro de Carvalho

Relativamente às perturbações nas crianças e adolescentes, o Secretário de Estado Adjunto e da Saúde referiu o aumento do número de internamentos por alterações do comportamento e assegurou que, ainda neste primeiro semestre de 2016, serão criadas camas no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, uma vez que em todo o território nacional, apenas existem as do Centro Hospitalar do Porto, para cobrir toda a zona norte, e as do Centro Hospitalar de Lisboa Central, para cobrir toda a zona sul do país.
Fernando Araújo destacou ainda o aumento da incidência das perturbações depressivas e da ansiedade, assim como das demências. Neste contexto, reforçou a necessidade de preparar os Cuidados de Saúde Primários (CSP) para um maior envolvimento nos problemas relacionados com a saúde mental. Contudo, “até agora essa resposta ainda não foi conseguida”. Dentro das medidas previstas para otimizar os cuidados prestados pelos CSP no âmbito da saúde mental inclui-se o reforço de psicólogos nos Centros de Saúde até ao final deste ano.

Portugal é o maior consumidor europeu de benzodiazepinas

Quanto à utilização de psicofármacos, Fernando Araújo lembrou que Portugal é o país europeu com maior consumo de benzodiazepinas, “o que deve ser motivo de preocupação, dados os efeitos de dependência associados a estes medicamentos”.
Segundo Álvaro de Carvalho, na origem desta situação pode estar uma “eventual má qualidade da prescrição médica”, uma vez que “os ansiolíticos continuam a ser frequentemente utilizados para tratar perturbações depressivas, uma vez que induzem um alívio rápido dos sintomas”. Na perspetiva do diretor do Programa Nacional para a Saúde Mental, “embora exijam prescrição médica, estes fármacos são muitas vezes obtidos livremente nas farmácias”. Para reverter esta tendência, o diretor do Programa Nacional para a Saúde Mental sugeriu uma maior aposta na formação dos profissionais, nomeadamente dos CSP, e uma redução da comparticipação destes fármacos.

Cátia Jorge

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