Artrite Reumatoide: “a melhor prevenção é o diagnóstico precoce”
Assinala-se hoje, 5 de abril, o Dia Nacional do Doente com Artrite Reumatoide (AR). Uma patologia que, segundo o estudo EpiReumaPt, da Sociedade Portuguesa de Reumatologia (SPR), afeta cerca de 0,7% da população o que corresponde a 70 mil doentes. Luís Cunha Miranda, presidente da SPR, explica que a AR tem uma incidência “predominante no sexo feminino, sobretudo na faixa etária dos 35 aos 55 anos”. O especialista considera fundamental a população estar alerta para os sinais e sintomas precoces da AR, de forma a procurar ajuda médica.
Raio-X (RX) – O que é a artrite reumatoide?
Luís Cunha Miranda (LCM) – A atrite reumatoide é uma doença reumática, sistémica e crónica, ou seja, é uma doença que atinge as articulações, nomeadamente, das mãos, dos pés, dos joelhos e dos ombros. No entanto, este tipo de artrite poderá atingir também outros órgãos ou sistemas como a pele, o coração, os olhos, entre outros. Estima-se, com base no estudo EpiReumaPt da responsabilidade da Sociedade Portuguesa de Reumatologia (SPR), que esta patologia afete, em Portugal, cerca de 0,7% da população, o que corresponde a 70 mil doentes, sendo predominante no sexo feminino e atingindo o seu pico de incidência na faixa etária dos 35 aos 55 anos. Contudo, há doentes mais tardios e outros mais precoces.
RX – Quais são as causas da artrite reumatoide?
LCM – Não existe uma causa, uma vez que é uma patologia associada ao sistema imunitário e à resposta imunitária na qual há a presença de anticorpos – os fatores reumatoides. No entanto, sabemos que a componente genética é um fator importante nos casos de artrite reumatoide. No que toca aos fatores de risco, o tabaco duplica o risco de desenvolvimento desta patologia.
RX – Quais são as manifestações que devem levar a suspeitar desta patologia?
LCM – As manifestações óbvias passam por dor, inflamação, inchaço, edema, sensação de calor nas articulações que persiste ao longo do tempo. No caso da dor, ela manifesta-se mais intensamente pelo período da manhã e na maioria dos casos, melhora com o movimento. Esta dor está frequentemente associada a uma rigidez matinal, ou seja, a pessoa sente-se “enferrujada” de manhã por um período superior a 45 minutos / 60 minutos e esta situação torna-se persistente.
Quando se trata de situações únicas, o doente pode estar apenas perante um caso de traumatismo ou outro tipo de patologia mas, se este tipo de situações se prolongar no tempo, o doente deve estar alerta para identificar que algo não está bem e recorrer, em primeiro lugar, ao médico de família.
RX – Como é feito o diagnóstico?
LCM – O diagnóstico é principalmente clínico, através das queixas do doente e da avaliação por parte do médico, nomeadamente, do reumatologista. Complementando esta avaliação, são frequentemente usados os exames de diagnóstico, nos quais se inserem, principalmente, as análises e o Raio-X. Aquando do diagnóstico, o médico deve estar alerta para distinguir se é uma artrite reumatoide, se é outro tipo de artrite ou se se trata de outras patologias das articulações que podem parecer artrite reumatoide.
RX – Como se trata?
LCM – A artrite reumatoide trata-se, em primeiro lugar, com um bom diagnóstico, com um acompanhamento correto por parte de um reumatologista. Partindo daí conseguimos definir um plano terapêutico que implica um seguimento regular em consultas de Reumatologia. Temos ao nosso dispor um conjunto de medicamentos que devemos indicar aos nossos doentes, na maior parte das vezes, de forma faseada, ou seja, se o doente corresponder a determinados fármacos que são menos agressivos e que têm menos efeitos secundários no organismo, começamos por esse tipo de medicamentos. Depois, numa próxima revisão da terapêutica, podemos ir aumentando, quer em dosagem, quer em complexidade ou até fazer associações terapêuticas. Felizmente, hoje em dia, dispomos de um conjunto muito vasto de medicamentos para tratar a artrite reumatoide.
RX – É possível fazer a prevenção da artrite reumatoide?
LCM – A prevenção deste tipo de artrite é semelhante à recomendada para todas as doenças reumáticas. Uma boa alimentação, evitar o excesso de peso e evitar o tabaco. Porém, a melhor prevenção é o diagnóstico precoce. Os doentes devem estar atentos e, ao primeiro sinal de articulações inchadas/inflamadas que perduram no tempo, devem procurar de imediato um médico de família ou um reumatologista. Sendo que o médico de família poderá fazer a primeira avaliação e depois encaminhar para a especialidade.
RX – Quais são as consequências da artrite reumatoide?
LCM – A atrite reumatoide é uma doença que pode ser facilmente controlável. Ou seja, com o tratamento adequado, conseguimos, praticamente, devolver o doente “à normalidade” e fazer com que, durante algum tempo, esteja estável e a fazer a sua vida normal. Para isso, tem de haver um seguimento correto por parte da Reumatologia e uma orientação terapêutica eficaz e que o doente possa seguir.
Por outro lado, se existir um atraso no diagnóstico, uma tendência para mau prognóstico por se tratar de uma “doença muito agressiva”, o incumprimento da medicação por parte do doente, ou até um diagnóstico errado, esta doença pode ser altamente incapacitante e pode criar, nos doentes, limitações muito grandes com destruição das articulações. Tendo em conta que esta é uma doença que se traduz na inflamação das articulações, pode existir a destruição das mesmas e um dos fatores importantes no correto tratamento desta doença é, precisamente, não deixar que essa destruição aconteça. Após a destruição da articulação, já não se consegue regenerar. E é importante que se perceba que na AR é perfeitamente possível tratar e travar a inflamação da articulação para que isto não aconteça.
RX – No âmbito deste Dia Nacional do Doente com Artrite Reumatoide qual é a mensagem que gostaria de deixar?
LCM – Gostaria, em primeiro lugar, de deixar claro que, apesar do caminho que nós fizemos até aqui, enquanto especialidade e, enquanto reumatologistas, ainda precisamos de mais apoio para podermos chegar aos doentes com AR. No que toca aos doentes, é importante que procurem de imediato o reumatologista, o apoio, e nunca ignorem as suas dores, as suas limitações porque o diagnóstico precoce e o seguimento em Reumatologia são fundamentais para que estes doentes possam ser cidadãos de direito.
E como será ser cuidadora?
Foi o sofrimento da mãe que fez com que Arsisete Saraiva abraçasse a presidência da ANDAR como forma de poder ajudar e defender outros doentes que sofrem desta doença. Arsisete explicou, em entrevista ao Raio-X, como é ser cuidadora de um doente com artrite reumatoide.
RX – Com que idade é que a sua mãe foi diagnosticada com artrite reumatoide?
AS – A minha mãe só foi diagnosticada, quando chegou pela primeira vez ao reumatologista, com cerca de 70 anos, mas a doença começou por volta dos 40 anos. Foram 30 anos de grande sofrimento só a fazer anti-inflamatórios, que acabaram por lhe provocarem uma úlcera no estomago, tendo sido operada 3 vezes. Isto porque na altura não existiam protetores gástricos. Era apenas tratada no médico da “caixa”. Nesse tempo ainda não existiam medicamentos inovadores. Graças a Deus que hoje existe terapêutica inovadora, que veio revolucionar o tratamento destes doentes, aumento-lhes a esperança de vida em 10 anos. Hoje podem ter uma vida ativa e feliz.
RX – O que mudou na vida da sua mãe após o diagnóstico e, inclusivamente, na sua também?
AS – Na vida da minha mãe mudou tudo. Embora tivesse chegado tardiamente ao reumatologista. Conseguiu estacionar a evolução da doença e os últimos anos da sua vida foram com qualidade, embora as deformações não tivessem desaparecido, mas as dores diminuíram e podia fazer uma vida normal. A minha vida, também mudou, porque nos piores momentos de crise, eu tinha de ir todos os dias a casa da minha mãe para a levantar, fazer a higiene pessoal e deixá-la sentada até eu voltar novamente. Isto não era fácil, pois estava empregada tinha marido e um filho pequeno que era preciso levar para o colégio e voltar a ir buscar. Enfim, a vida não foi fácil.
RX – Quais foram as limitações que a mesma encontrou no seu dia-a-dia?
AS – Limitações tão simples como pegar num copo de água, calçar os sapatos, abrir a porta ou uma janela, vestir-se e até mesmo pegar nos talheres para comer
RX – Como foi cuidar da sua mãe com as limitações impostas pela artrite reumatoide?
AS – A minha mãe precisava e dependia de mim para lhe fazer quase tudo. Quando o meu pai ainda era vivo, nós dividíamos as tarefas, mas depois de ele falecer foi mais difícil. Era sozinha para cuidar de tudo. Entretanto o meu filho casou-se e saiu de casa e a minha mãe passou a viver comigo. Esta fase veio coincidir com a primeira consulta no reumatologista e a nossa vida melhorou muito e digo nossa, porque foi a minha e a da minha mãe.
Por Rita Rodrigues