“O tratamento da leucemia mieloide aguda tem evoluído ao longo dos anos”
Assinalou-se ontem, 21 de abril, o Dia Mundial de Sensibilização para a Leucemia Mieloide Aguda (LMA), um cancro raro e agressivo do sangue e da medula óssea que interfere no desenvolvimento de células sanguíneas saudáveis. A Associação Portuguesa Contra a Leucemia alerta para a importância de, mesmo em tempos de pandemia, diagnosticar e tratar o mais cedo possível esta patologia, de forma a que os doentes tenham maior probabilidade de sobreviver. Em entrevista ao Raio-X, Albertina Nunes, hematologista no IPO de Lisboa, fala sobre a prevalência, o diagnóstico e o tratamento desta doença.
Raio-X (RX) – Qual a prevalência da LMA no mundo? E em Portugal?
Albertina Nunes (AN) – A LMA é uma doença rara. É a leucemia aguda mais frequente no adulto e representa 25% dos casos de leucemia. Dados internacionais referem que a incidência é de cerca de 5 por 100 000 habitantes, com aumento da incidência em doentes com idade avançada; a idade mediana de diagnóstico é cerca de 67 anos. À medida que aumenta a esperança de vida maior será a incidência da leucemia mieloide aguda.
RX – Quais os principais sintomas desta patologia?
AN – Os sintomas das leucemias agudas são pouco específicos e relacionados com a diminuição das células normais do sangue- o doente pode ter cansaço pela anemia, hemorragias pela diminuição do número de plaquetas ou infeções pela diminuição dos neutrófilos. Os doentes podem também ter dores ósseas ou febre relacionados com a acumulação das células neoplásicas na medula óssea.
RX – Quanto ao diagnóstico, quais os meios atualmente disponíveis?
AN – O diagnóstico é colocado quando o médico requisita análises ao sangue e, no hemograma, há alterações, podendo ser observados blastos, que são característicos da doença. Contudo na análise podem ser referidos blastos e não se tratar de leucemia aguda. É necessário fazer mais estudos, nomeadamente, uma avaliação da medula óssea, que é onde têm origem as células do sangue. Quando se faz a avaliação medular fazem-se estudos complexos como a avaliação genética das células leucémicas que permitem confirmar o diagnóstico, permitem escolher o plano terapêutico e estabelecer o prognóstico. A leucemia mieloide aguda é uma doença sistémica e o tratamento não está dependente do estadiamento tal como é entendido em outros cancros. O tratamento é individualizado de acordo com dados clínicos e a caracterização dos blastos.
RX – Em termos de terapêutica, qual tem sido a evolução?
AN – O tratamento da leucemia mieloide aguda tem evoluído ao longo dos anos, alicerçado na compreensão da doença através de investigação laboratorial e clínica. Um subtipo, a leucemia aguda promielocítica, tem um tratamento próprio, muito eficaz, utilizando um agente capaz de induzir a maturação das células leucémicas. Os doentes com outros subtipos são avaliados, na altura do diagnóstico, para se decidir se fará tratamento mais agressivo que permita ficar em remissão. Ficar em remissão significa reduzir muito as células leucémicas o que permite normalizar a análise do sangue. Após a remissão o tratamento é consolidado com mais quimioterapia e, se necessário, com transplantação de medula óssea. Esta terapêutica é complexa, mas tem como objetivo atingir a cura. Quando o doente é mais frágil o médico opta por tratamentos menos agressivos, realizados em ambulatório, que aumentam o tempo de vida com qualidade. Recentemente novos agentes dirigidos a alterações encontradas nos blastos de cada doente têm permitido a utilização de tratamentos personalizados.
RX – Quais as perspetivas de futuro no tratamento da LMA?
AN – Nos últimos anos surgiram novos medicamentos para a leucemia mieloide aguda que podem vir a melhorar o prognóstico desta doença, alguns, já aprovados, fazem parte das opções terapêuticas no presente; outros estão em investigação e, com a participação em ensaios clínicos, esperamos que demonstrem relevância clínica para mais doentes poderem viver mais tempo.
Por Marisa Teixeira