Carlos Robalo Cordeiro eleito presidente da European Respiratory Society
Acabam de ser oficializados os resultados das eleições para a presidência da ERS, das quais Carlos Robalo Cordeiro saiu vencedor. O Pneumologista do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra e diretor da Faculdade de Medicina de Coimbra é o primeiro português a ocupar este cargo. Em entrevista ao Raio-X, não esconde a satisfação pessoal e profissional, nem o desejo de trazer para Lisboa um congresso anual da ERS.
Raio-X (RX) – Acaba de ser eleito o próximo presidente da ERS. É o primeiro português a ocupar este cargo. O que é que isto representa para si a nível pessoal e profissional?
Carlos Robalo Cordeiro (CRC) – Como calcula é uma enorme honra a que se associa a uma não menor responsabilidade. E é simultaneamente uma sensação de preenchimento pessoal e profissional e de compromisso e gratidão para com os meus mestres, os meus colegas, os meus discípulos, os doentes respiratórios, e, last but not least, a minha família, a quem tudo devo e tudo é devido.
RX – E o que representa para a pneumologia Portuguesa?
CRC – A minha eleição é também um reconhecimento do trabalho que a Pneumologia portuguesa vem desenvolvendo. Estou muito grato à Pneumologia portuguesa por me ter permitido chegar até aqui e muito grato particularmente à SPP por todo o apoio que me concedeu, nomeadamente neste processo eleitoral.
RX – Qual tem sido o contributo da ERS para a evolução da Pneumologia não só na Europa, como a nível global?
CRC – A ERS é, atualmente, a sociedade respiratória global e consequentemente toda a sua vasta agenda nas áreas científica, educacional e de advocacy assumem um impacto universal. É neste contexto abrangente que a ERS vem contribuindo decisivamente para o avanço do conhecimento na área respiratória e para a sua correta, eficiente e consistente divulgação.
RX – Antes da pandemia a ERS já organizava alguns eventos virtuais que aproximava os especialistas de vários países e até de vários continentes sem os obrigar a deslocarem-se, com a nova realidade imposta pela pandemia, acredita que o caminho será mais virtual? Mesmo no que respeita ao grande congresso que anualmente junta mais de 20.000 especialistas de todo o mundo?
CRC – Acredito que sim. A experiência prévia da ERS, por exemplo na organização do programa híbrido Satellites, com forte componente virtual e global a partir de 4 hubs em cidades europeias, permitiu-lhe promover com eficácia o congresso anual que ontem terminou, e que contou com a adesão impressionante de mais de 30 mil participantes em todo o mundo.
Se este modelo misto perdurará no futuro, ninguém lhe conseguirá responder com segurança, mas tal poderia permitir, por exemplo, que o congresso da ERS encontre outros locais alternativos aos que ano após ano se vêm repetindo. Há dois anos identificámos cinco cidades com potencial para receber o congresso anual na possibilidade de o número de participantes presenciais diminuir de forma significativa, e Lisboa é a primeira cidade nessa lista!
RX – Numa altura em que as doenças crónicas representam a principal causa de morte a nível mundial, vemo-nos agora confrontados com uma pandemia causada por um agente infecioso. O mundo não estava claramente preparado para esta realidade (alguns países menos que outros). Há forma de prever situações destas e antecipar as medidas necessárias?
CRC – De facto, ninguém estava preparado para uma situação como a que estamos a viver, independentemente da maior ou menor credibilidade com que os diferentes países reagiram, e eu diria que é desejável, embora difícil, que a evolução do conhecimento possa eventualmente permitir prever estes eventos com alguma segurança, mas que é fundamental também aprender com a crise que atravessamos e saber assim antecipar e programar as medidas obrigatórias para minimizar as respetivas consequências. E a ciência deve liderar estes processos.
RX – As alterações climáticas e ambientais, a degradação da qualidade do ar e o tabagismo têm sido as grandes preocupações da ERS. Enquanto pneumologista e agora na qualidade de futuro presidente da ERS, sente que é também nestes fatores que residem as principais causas de doença respiratória?
CRC – Não tenho dúvida que o aumento da prevalência da patologia respiratória assenta fundamentalmente num défice de prevenção, ao nível do controlo da epidemia tabágica, como da qualidade do ar ambiental e indoor, bem como das doenças infeciosas.
Mas é igualmente necessário não minimizar a repercussão do envelhecimento da população e o seu impacto nas principais causas de morbilidade e mortalidade por doença respiratória.
RX – Como pode a ERS tomar medidas com impacto real para combater estes problemas?
CRC – Embora seja estruturalmente uma sociedade científica, a ERS contribui de forma significativa para a promoção de medidas de prevenção da doença respiratória, não apenas através de diversos fóruns de intervenção e estratégia onde participa, como a Biomed Alliance, mas também através de lobbying a partir da sua sede de Bruxelas. O íntimo relacionamento com a ELF (Fundação Europeia do Pulmão) permite igualmente o desenvolvimento de inúmeras ações de awareness na doença respiratória, com impacto relevante.
RX – As desigualdades de acesso a cuidados diferenciados em pneumologia é ainda uma realidade que deixa algumas populações mais fragilizadas. Esta é também uma luta da ERS?
CRC – Absolutamente. Dou-lhe um exemplo, a publicação recente, num número do European Respiratory Journal de 2018, dos “10 principles for lung health”, uma tomada de posição para melhorar a saúde respiratória globalmente, tem precisamente esse aspeto em consideração, a desigualdade de acesso a cuidados de saúde na nossa área.
RX – Quais os seus principais objetivos para este mandato?
CRC – Inicio agora, no dia 11 de setembro, aquilo que é designado na ERS pelo ciclo presidencial e que me conduzirá, sucessivamente e durante 4 anos, a vice-presidente, de 2020 a 2021, depois presidente eleito de setembro de 2021 a setembro de 2022, a presidente de 2022 a 2023 e finalmente past-president de setembro de 2023 a setembro de 2024. Tenho tempo para refletir e para assumir ideias e projetos que vou maturando.
Por Cátia Jorge