“As meningites bacterianas são agressivas, com risco de mortalidade e podem deixar sequelas”
Existem dois tipos de meningite, as virais e as bacterianas, sendo estas últimas as mais preocupantes, pois podem ser fatais e deixam, muitas vezes, sequelas. Em entrevista ao Raio-X, Hugo Rodrigues, pediatra na Unidade Local de Saúde do Alto Minho, responsável pelo site “Pediatria para todos” e autor de “O Livro do seu Bebé” e “O Livro Mágico do Avô João”, fala-nos desta problemática que atinge sobretudo os mais novos.
Qual o impacto da meningite meningocócica no nosso país em termos de prevalência?
A doença meningocócica afeta, em média, cerca de 40/50 portugueses. Esta é uma infeção com um caráter ondulante que aumenta e diminui, mas que, atualmente, tem vindo a registar um decréscimo, de ano para ano. Uma situação que é facilmente justificada pela criação de vacinas que funcionam como uma barreira protetora.
Além disso, este ano, com as medidas de isolamento, confinamento, utilização de máscara e distanciamento social, o impacto desta infeção bacteriana tem vindo a diminuir. Uma redução que se faz sentir não só em Portugal como nos restantes países europeus. Um cenário facilmente justificável visto que, à semelhança do que acontece com o novo coronavírus, esta é uma infeção que se transmite por meio de secreções respiratórias e da saliva, durante contato próximo com uma pessoa infetada.
E quais os tipos de meningites mais frequentes?
Existem dois tipos de meningite, as virais e as bacterianas. Ao falarmos de meningites virais é importante salientar que estas não nos colocam grandes problemas, não deixam sequelas e, apesar de ser um cenário assustador, duram, em média, três a cinco dias com um tratamento sintomático.
Por outro lado, temos as meningites bacterianas que são agressivas, com risco de mortalidade e podem deixar sequelas. Existem diversos tipos conhecidos, mas só seis provocam doença, os tipos A, B, C, W, X e Y.
Quais os principais sintomas?
Os sintomas clássicos de meningite meningocócica passam por febre, vómitos, mau estar geral e, em idades mais avançadas, contamos ainda com dor de cabeça e o aparecimento de pequenas manchas na pele que não desaparecem ao toque (nas primeiras 24 horas de febre). Como são sintomas pouco específicos não traduzem o alerta para uma meningite. Contudo, quando há suspeita de meningite meningocócica temos de atuar rapidamente para evitar a evolução da doença e garantir o bem-estar geral da criança, mesmo quando baixa a febre.
Quais as faixas etárias mais afetadas?
O meningococo B é o tipo de meningite meningocócica mais frequente e afeta sobretudo os mais novos. O grupo mais afetado são os bebés com dois meses de idade, uma faixa etária muito frágil e que tem o organismo em amadurecimento, o que não ajuda quando falamos de sintomas pouco específicos. Depois há também um pico na adolescência apesar de, em Portugal, não ser muito notório. De resto há sempre um risco, embora baixo, para qualquer idade.
Qual o diagnóstico diferencial e qual deve ser a melhor abordagem por parte do médico?
Ao falarmos de diagnóstico diferencial e a abordagem por parte de um especialista, é importante referir que, perante um quadro de doença, o primeiro passo deve ser feito pelos pais com a deslocação a um serviço de urgência, pois todo o tempo conta. Já da parte do especialista, a abordagem passa por uma avaliação do estado geral da criança para perceber se temos pistas de diagnóstico, com algumas manobras de base, como analisar os sinais da infeção, por exemplo, se a criança mexe bem o pescoço (mobilidade confirmada).
E, perante uma suspeita de meningite, particularmente uma meningite bacteriana, temos de atuar no imediato de duas formas: fazer uma punção lombar e retirar o líquido que cobre a medula espinhal através da introdução de uma agulha entre as vertebras, e esse líquido ajuda-nos no diagnóstico. Referindo que devemos iniciar logo um antibiótico que cura este tipo de infeção e, às vezes, nem esperamos pelo resultado para uma resposta mais rápida.
Quais as principais sequelas em sobreviventes de meningite?
A infeção pelo meningococo B tem uma mortalidade entre os 5 e os 7%, referindo que uma em cada cinco pessoas que sobrevive fica com sequelas. Estas dividem-se em cinco grandes grupos:
- Sequelas neurológicas: alterações motoras, epilepsia, transtornos convulsivos;
- Sequelas físicas: alguns casos podem levar a amputações, referindo que cada caso depende do nível de evolução da infeção;
- Sequelas sensórias: perda auditiva ou visual;
- Sequelas cognitivas: atraso no desenvolvimento que vai culminar num défice intelectual;
- Sequelas sistémicas: lesões nos órgãos ou desregulação hormonal.
Qual a importância da vacinação?
A única forma de prevenir a infeção é através da vacinação e o contexto atual com a pandemia da COVID-19 veio demonstrar o papel das vacinas. É importante alertar que a vacina para o meningococo B já está disponível, desde dia 1 de outubro de 2020, no plano nacional de vacinação, abrangendo todas as crianças que nasceram desde o dia 1 de janeiro de 2019. Por outro lado, todas as crianças que nasceram antes não estão abrangidas, sendo o custo por feito por parte dos familiares.
A população em geral está sensibilizada para a problemática da meningite?
Há cada vez mais informação sobre a problemática da meningite e a população portuguesa está cada vez mais sensibilizada para quais os cuidados a ter. Contudo, face à diversidade e tipos de meningite, desde bacterianas a virais, é importante apostarmos em programas e campanhas de sensibilização.
Por Marisa Teixeira