Relatório de Primavera 2022 – “E Agora?” | Estratégia na Saúde está por definir
As grandes crises, por norma, deixam a descoberto as nossas maiores fragilidades. Por isso, devem ser, essencialmente, grandes desafios aos quais precisamos responder com inteligência para sairmos das mesmas com maior capacidade de resiliência. O Relatório de Primavera 2022, foi apresentado publicamente no dia 21 de junho, na Fundação Calouste Gulbenkian, encerra muitas questões, mas também deixa propostas.
O documento, da autoria do Observatório Português dos Sistemas de Saúde (OPSS), enuncia os três maiores desafios do Serviço Nacional de Saúde: o acesso aos cuidados de saúde; a garantia de recursos humanos suficientes e competentes; e a melhoria da saúde da população, através da prevenção e promoção da saúde. Paralelamente, enumera “tentativas de resposta” recentes e ambiciosas, que constam do novo Estatuto do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR): a reforma da saúde mental; a digitalização da saúde; a dedicação plena; e a criação dos Sistemas Locais de Saúde.
Apesar de se vislumbrar alguma proximidade entre os desafios apresentados pelos autores, bem como as tentativas de resposta, destaca-se uma questão fundamental: qual é a orientação estratégica estrutural que se pretende seguir na saúde?
Qual a estratégia para uma população mais saudável e com maior bem-estar, independentemente do seu estatuto económico e social. Ou seja, qual o reforço que se pretende para a saúde pública e as suas aliadas, a ciência e as políticas sociais? Qual a estratégia de saúde pública para nos prepararmos para futuras pandemias?
Falta saber como atrair, motivar e reter os profissionais da saúde. De que forma será implementada a dedicação plena, ponto central no novo Estatuto do SNS, e se o modelo será para aplicar a todos os profissionais? Que indicadores de resultados serão adotados e de que modo demonstram resultados em saúde?
De um ponto de vista mais abrangente, e regressando à Lei de Bases da Saúde, falta saber qual arquitetura se pretende no futuro para o sistema de saúde português. Se, de facto, se pretende que os setores privado e social sejam complementares, faltam indicações claras sobre como o SNS responderá às maiores necessidades, evitando que o recurso aos privados, com graves implicações financeiras para as famílias, continue a ser indispensável.
Para os autores, muitas incógnitas persistem, também, sobre as inovações que a pandemia promoveu. Falta saber de que forma a digitalização da saúde, ponto central e promissor do PRR, será desenvolvida. Como poderá a saúde digital ser efetivamente um contributo central para a integração e continuidade de cuidados centrados na pessoa/família? Será a saúde digital o instrumento que nos permita aumentar a capacidade de resposta, no presente e nas futuras pandemias?
Falta saber se o “cuidar em casa”, tal como a saúde digital, será uma forma de aumentar e melhorar as respostas. Será que esta estratégia estará baseada nos princípios já referidos, de cuidados centrados na pessoa/família, integrados e que garantam continuidade? E serão dadas melhores condições aos cuidadores informais/familiares, essenciais para a estratégia de cuidados domiciliários?
Finalmente, falta saber que destino será dado a outras inovações dos tempos mais duros da pandemia, como o acesso de proximidade aos medicamentos, os mecanismos de apoio ao desenvolvimento e à avaliação rápidos de testes e vacinas, e a adaptação dos processos para que esta inovação seja acessível a todos.
Um Relatório de Primavera 2022 em forma de pergunta, pelas várias interrogações que encerra, mas também com algumas propostas de resposta, para acompanhar em 2023.
A Coordenação do OPSS
Filipa Duarte-Ramos (FFUL) | Henrique Barros (ISPUP) | João Gonçalves (FFUL) | Julian Perelman (ENSP-NOVA) | Manuel Lopes (U. Évora) | Paulo Sousa (ENSP-NOVA) | Pedro Lopes Ferreira (CEISUC) | Vitor Raposo (CEISUC)