Cancro do pulmão: perspetiva do médico de família

Eurico Silva, especialista em Medicina Geral e Familiar na USF João Semana, em Ovar, partilhou com o Raio-X um artigo de sua autoria sobre o tabagismo como o principal fator de risco para o cancro do pulmão.

No evento Cancer Summit abordei como o tabagismo tem de ser uma das preocupações no dia a dia da equipa de saúde. Sendo o fator de risco número um para cancro, não podemos descurar ações para prevenir, reduzir e cessar o tabagismo. Neste sentido, as Unidades de Saúde Familiar (USF)/Unidades de Cuidados de Saúde Personalizados (UCSP) têm contratualizados quatro  indicadores do seu IDG (índice de desempenho geral), que avaliam a prevalência de tabagismo, mas também refletem práticas de melhoria com as intervenções dirigidas à cessação tabágica.

O assunto é de tal forma importante que a USF onde me encontro acolheu, para 2021, um plano de acompanhamento interno com o objetivo de melhorar estes indicadores e, consequentemente, criar uma tendência de redução do tabagismo na população. No meu ficheiro de 1800 utentes, tenho uma prevalência de 17% de hábitos tabágicos, o que é elevadíssimo, pensando que estamos no século XXI, e bem conscientes dos riscos associados. Um outro fator de risco importante para cancro do pulmão é a Doença Pulmonar Obstrutiva Crónica (DPOC), com ou sem tabaco. Os pacientes com DPOC pela inflamação pulmonar, mecanismos genéticos de defesa alterados, entre outros, têm, como apresentam as GOLD 2021, maior risco para cancro do pulmão. Logo, precisamos de estar alerta para esta população, de forma a assegurar uma deteção precoce.  Neste sentido, deixo algumas das questões/reflexões que levantei na apresentação do dia 19 de junho sobre os utentes com DPOC do ficheiro de um médico de família:

  • Quantos são fumadores ativos?
  • Quantos são ex-fumadores?
  • Quantos fizeram pelo menos uma TC tórax?
  • Quantas TC tórax com alterações que justificam vigilância e de que forma?
  • Quantos doentes com DPOC têm pelo menos uma consulta presencial por ano?

Após o diagnóstico de um cancro e o encaminhamento para meio hospitalar, é frequente perder-se um pouco a ligação do utente com a equipa de saúde dos cuidados de saúde primários, o que não é desejável, pois estudos mostram que, embora os utentes compreendam que os cuidados oncológicos são prestados nos cuidados hospitalares, desejam, simultaneamente, manter contacto com a sua conhecida e próxima equipa de saúde.

E, na verdade, há muito a fazer! Como, por exemplo, a gestão dos restantes problemas e comorbilidades que têm impacto no estado de saúde global ou o sermos proativos na vacinação, nomeadamente antigripal e antipneumocócica, pois infeções oportunistas poderão pôr em causa os timings de tratamento e mesmo serem as responsáveis pela morte. Assim, é fundamental que as equipas de saúde estejam sintonizadas de que estas duas vacinações estão indicadas em todos os doentes oncológicos e não estão contraindicadas com os tratamentos. Há períodos melhores para administração, mas, mesmo que o utente já esteja sob tratamento oncológico, o que poderá acontecer é a vacinação ser menos eficaz. Já é minha prática, à altura do diagnóstico, avaliar o estado vacinal e promover a vacinação nesse mesmo momento. Mais tempo ganho!

E, claro, a gestão e apoio de toda a família que passa a estar num estado de maior fragilidade.

Outros aspetos não menos importantes são aumentar a literacia em saúde, que compreende o conhecimento da doença e que podemos promover com orientação para endereços como https://www.cancro-online.pt/ e associações de doentes como a https://pulmonale.pt/,  e apoiar na orientação dos direitos/regalias que o doente oncológico tem e que, nesta situação de fragilidade, deve usufruir.

O cancro do pulmão é sempre um choque para o doente, família e equipa de saúde. Como médicos e enfermeiros de família, estamos vocacionados para o tratar e resolver. As situações oncológicas relacionadas com este tipo de cancro são sempre de grande complexidade e que nos tiram do nosso lugar de conforto. E é assim que também evoluímos, para dar os melhores cuidados, juntos, rumo à saúde!

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