“É pela dor que os pacientes com disfunção temporomandibular procuram tratamento”
No próximo dia 25 de março, o Porto vai receber o 1st International SPDOF Meeting Day. Organizado pela Sociedade Portuguesa de Disfunção Têmporo-Mandibular e Dor Oro-Facial (SPDOF), a reunião estará centrada na abordagem interdisciplinar dos distúrbios musculares da disfunção temporomandibular. Em entrevista ao Raio-X, Tiago Oliveira, fisioterapeuta do Hospital Distrital da Figueira da Foz e sócio-fundador da SPDOF, alerta para a importância de diagnosticar e tratar estes distúrbios com vista à melhoria da qualidade de vida dos doentes. Ricardo Santos, terapeuta da fala no Hospital CUF do Porto desvenda alguns dos pontos altos deste 1st International SPDOF Meeting Day.
Raio-X (RX) – Quais os principais tipos de disfunção temporomandibular?
Tiago Oliveira (TO) – O termo clínico “Disfunção Temporomandibular” (DTM) é na verdade bastante redutor em relação à quantidade de sinais e sintomas que podem estar presentes, assim como à quantidade e complexidade de sistemas anatomofisiológicos envolvidos.
Relativamente à sua classificação existe já uma taxonomia bastante completa, e que a SPDOF publicou no seu segundo livro, que esquematiza e subdivide de forma muito sistemática a patologia, sendo na verdade um documento extenso. Se quisermos simplificar um pouco poderemos dividir a disfunção temporomandibular (DTM) em DTM muscular, DTM articular e DTM mista.
RX – Que fatores estão na sua origem e que tipo de sintomatologia se encontra?
TO – A etiologia da DTM é multifatorial e multissistémica, havendo um leque enorme de fatores etiológicos. Se excluirmos as causas traumáticas, teremos como principais fatores intrínsecos os desequilíbrios e alterações anatómicas. Como fatores extrínsecos, chamemos-lhes agravantes ou perpetuantes, existem os maus hábitos oclusais como comer pastilha elástica, roer as unhas, entre outros, aos quais chamamos hábitos parafuncionais. Ainda como fatores agravantes e perpetuantes, existem maus hábitos e alterações posturais, stresse e alterações emocionais. Os principais sinais e sintomas associados às DTM passam pela presença de dor ou desconforto na região da articulação e, muitas vezes estas dores podem referir para o ouvido, face e/ou cabeça. Para além dos sintomas dolorosos, podem estar presentes ruídos articulares e limitação das amplitudes articulares da mandíbula, levando a uma diminuição da abertura oral ou uma abertura com alteração do trajeto de movimento normal.
RX – Como são diagnosticadas?
TO – O diagnóstico da DTM é essencialmente clínico não existindo nenhum exame específico para confirmar a patologia. Obviamente que, numa patologia deste género, em que as estruturas afetadas são sempre várias e o tipo de afeção pode também variar bastante, poderá haver lugar à realização de exames para confirmação dos achados clínicos.
RX – Quais as principais implicações que representam na qualidade de vida dos doentes?
TO – Os pacientes podem ver a sua qualidade de vida afetada quer pela dor, quer pela limitação em diferentes funções, desde o falar, ao mastigar, ao engolir, ao bocejar, entre muitas outras.
A dor é sempre uma experiência subjetiva e individual, no entanto assume uma importância tal que há já bastantes anos foi considerada como o quinto sinal vital. É pela dor e pelas suas implicações físicas e emocionais que os pacientes, na maioria das vezes, se sentem mais afetados e procuram tratamento.
No entanto, independentemente da presença ou não, de dor, existem pessoas em que a DTM acarreta uma tal limitação funcional que pode condicionar atividades da vida diária tais como comer e falar.
RX – É importante corrigir e tratar essas disfunções?
TO – As estatísticas sobre incidência de DTM na população são muito variáveis, mas, de forma geral, todos os estudos apresentam números de incidência elevados. No entanto, nem todas as pessoas portadoras de DTM terão sintomas com intensidade suficiente para procurar tratamento, nem mesmo uma afeção funcional com implicações nas atividades da vida diária.
Apesar disto, indivíduos com sinais e sintomas de DTM devem ser sempre avaliados pois, se existem tipos de DTM com as quais se pode viver confortavelmente, existem outras que poderão degenerar em problemas mais complicados e de difícil tratamento.
RX – Quando há indicação terapêutica, quais as principais estratégias de correção e tratamento, tanto da disfunção em si, como das potenciais comorbilidades?
TO – As principais guidelines para o tratamento da DTM defendem que o tratamento deve evoluir do mais conservador e reversível possível para as terapêuticas mais invasivas. Assim, na linha da frente do tratamento estão abordagens da Medicina Dentária, Fisioterapia, Terapia da Fala e Psicologia, entre outras áreas científicas.
Obviamente que existem casos em que objetivamente o tratamento de primeira linha poderá ser cirúrgico. Cada caso deve ser avaliado criteriosamente em contexto multiprofissional para a definição de um diagnóstico diferencial adequado que possibilite adequar o melhor tratamento possível.
ABORDAGEM MULTIDISCIPLINAR
RX – Quais as várias áreas profissionais envolvidas na abordagem destes doentes?
TO – Como já foi referido, as causas e áreas anatómicas envolvidas são de tal forma abrangentes que as equipas multidisciplinares têm também que ser bastante alargadas.
Na maioria dos casos, a equipa profissional que intervém em primeiro lugar é composta pelo Médico Dentista, Fisioterapeuta e Terapeuta da Fala. Nalguns casos verifica-se a presença de sinais do foro emocional, como o stresse e alterações psicoemocionais e mesmo comportamentais, pelo que é necessária a intervenção da Psicologia.
Ao nível do tratamento o Medico Dentista aborda estes pacientes com tratamentos que vão desde a confeção de goteiras oclusais à medicação dos pacientes. A Fisioterapia aborda os problemas estruturais e dor com metodologias que podem passar pela terapia manual e exercício terapêutico. Se existirem causas funcionais associadas, como alterações na deglutição, mastigação, respiração e fala a terapia da fala assume um papel fundamental na estabilização dos resultados obtidos.
De fato a sintomatologia é muito variada pelo que especialidades como a Reumatologia, Anestesiologia, Otorrinolaringologia, Neurologia entre outras podem muitas vezes são necessárias para a avaliação e intervenção nos casos de DTM.
Atualmente, as ditas “terapêuticas não convencionais” também podem oferecer o seu contributo e ser uma mais valia no tratamento destes pacientes, como é o exemplo da Medicina Tradicional Chinesa no controlo da dor.
RX – De que forma é feita a articulação entre os profissionais das diversas áreas?
TO – Nesta, como em qualquer outra área de intervenção, o diagnóstico e diagnóstico diferencial são de extrema relevância. A existência de equipas diferenciadas nesta área facilita a comunicação entre os profissionais, assim como o tratamento que é prestado aos pacientes com DTM
A DTM é, necessariamente, uma patologia que pode ter causas orais/oclusais e, ainda que não o tenha, pode referir sintomas para as estruturas intra-orais. Um exemplo prático é o de uma dor dentária causada por um trigger-point do músculo masséter. Assim, neste enquadramento será o Médico Dentista que deve assumir o papel de coordenar o diagnóstico e tratamento, através duma equipa multidisciplinar, que como já vimos poderá contar com diferentes profissionais de saúde, quer para o diagnóstico quer para o tratamento.
Neste 1st International SPDOF Meeting Day:
Ricardo Santos – Terapeuta da fala, Hospital CUF Porto
Um tema controverso
As opções terapêuticas no tratamento da DTM muscular e importância da referenciação precoce e diagnóstico diferencial em equipa pluridisciplinar. Pretendemos criar momentos de partilha e discussão onde os congressistas poderão ficar a par das mais recentes abordagens terapêuticas.
Um convidado especial
Todos os congressistas são convidados especiais. São eles que contribuem para o sucesso do evento e tudo faremos para que seja um congresso pleno de experiências enriquecedoras.
Uma preocupação relativamente às disfunções temporomandibulares
A necessidade de um diagnóstico o mais precoce possível e respetiva referenciação para equipas diferenciadas.
Uma necessidade urgente
Informação sobre esta patologia à população em geral e fomentar a criação de profissionais especializados nesta área de atuação.
Uma medida que pode melhorar o diagnóstico e acesso dos doentes ao tratamento adequado
Nível de informação dos Médicos de Saúde Geral e Familiar sobre esta condição para uma referenciação o mais atempada possível, possibilitando mais e melhores possibilidades terapêuticas de atuação.