Hepatites crónicas e a importância do diagnóstico precoce
Arsénio Santos, Coordenador do Núcleo de Estudos das Doenças do Fígado da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna, partilha um artigo de opinião no âmbito do Dia Mundial das Hepatites.
Comemora-se a 28 de julho o Dia Mundial das Hepatites, dia em que pessoas e organizações de todo o mundo unem esforços para sensibilizar as populações e os decisores para a importância destas doenças.
O dia 28 de julho foi escolhido em 2010 durante a 63.ª Assembleia Mundial da Saúde da Organização Mundial da Saúde, por ser o dia de aniversário de Baruch Blumberg, que descobriu o vírus da hepatite B e por isso ganhou o Prémio Nobel da Medicina em 1976. Nos últimos anos, a comemoração deste dia ganhou particular destaque pelo facto de a OMS ter assumido o objetivo de erradicar a hepatite C até 2030.
Existem cinco diferentes vírus causadores de hepatite (A, B, C, D e E), mas as hepatites B e C são as mais importantes, por evoluírem para a cronicidade e assim causarem graves problemas de saúde: provocam inflamação crónica do fígado, que, quando não tratada, pode evoluir para cirrose e cancro hepático.
A transmissão das hepatites B e C dá-se através da exposição ao sangue ou fluidos corporais de uma pessoa infetada. Assim, têm maior risco de estar infetadas pessoas com história de uso de drogas injetáveis, de relações sexuais não protegidas com múltiplos parceiros, de transfusões sanguíneas antes de 1990, de exposição a práticas de saúde e de estética sem os devidos cuidados de higiene e assepsia, entre outras.
Em Portugal, foram já identificados e tratados largos milhares de doentes com hepatite B ou C, mas calcula-se que poderão ainda existir algumas dezenas de milhar de casos não diagnosticados.
Os testes de diagnóstico estão recomendados em qualquer pessoa com alteração das análises hepáticas e naqueles em que se considere alguma possibilidade de exposição a estes vírus, no presente ou no passado. No nosso país, os testes de diagnóstico das hepatites estão acessíveis através de todos os serviços de saúde, nomeadamente centros de saúde, hospitais, laboratórios de análises e algumas farmácias.
O diagnóstico precoce traz grandes benefícios para as pessoas infetadas, pois permite o tratamento antes que se instalem lesões hepáticas, e para a saúde de toda a comunidade, já que ao eliminar o foco de infeção evita a propagação do vírus.
É um grande desafio conseguir identificar os portadores destes vírus em grupos populacionais vulneráveis e de abordagem difícil: utilizadores ativos de drogas injetáveis, reclusos, trabalhadores do sexo, sem-abrigo e imigrantes. Estão em curso em todo o país iniciativas dirigidas a essas populações, indo ao encontro das pessoas em risco e oferecendo-lhes a possibilidade de rastreio e de tratamento.
Do ponto de vista de cada indivíduo infetado, é muito compensador o diagnóstico precoce da doença, pois todas as formas de hepatite são, atualmente, tratáveis. O tratamento da hepatite C é um dos maiores casos de sucesso da Medicina moderna, existindo medicamentos que, tomados durante 8 a 12 semanas, curam a infeção em quase 100% dos casos; a hepatite B exige frequentemente medicação crónica, mas que impede a progressão da doença hepática.
Em tempos de pandemia pela COVID-19, as outras doenças não desapareceram e as hepatites crónicas não deixaram de constituir um importante problema de saúde pública. O Dia Mundial das Hepatites é uma excelente oportunidade para divulgar o conhecimento sobre estas doenças, motivar os profissionais de saúde para o rastreio, diagnóstico e tratamento das mesmas e sensibilizar as autoridades de saúde e os decisores políticos para a necessidade de alocarem os recursos indispensáveis.