Pensar a insónia e “o pensar” na insónia
A insónia, um dos distúrbios do sono mais prevalentes, afeta milhões de pessoas e pode ter um impacto profundo na qualidade de vida, saúde mental e bem-estar geral. Neste artigo de opinião, Maria João Martins e Alícia Marques, psicólogas clínicas nos Serviços de Saúde da Universidade de Coimbra e co-autoras do livro STOP Insónia! (PACTOR), exploram os desafios enfrentados por quem lida com este problema e apresentam soluções práticas baseadas em evidências científicas. O manual, concebido como um guia acessível e estruturado, combina a Terapia Cognitivo-Comportamental para a insónia com abordagens inovadoras das terapias de terceira geração, incluindo práticas de Mindfulness, aceitação e compaixão. Descubra neste artigo como é possível aprender a gerir e a superar a insónia, promovendo noites de sono reparador e um dia-a-dia mais equilibrado.
Responder à questão “porque não dormimos?” tem sido um grande desafio para a comunidade científica e clínica das mais diversas áreas da saúde. Sabemos que a insónia é uma perturbação multifatorial e multifacetada e que, por isso, não tem uma etiologia simples e, portanto, uma solução única. Quando não temos dificuldade em iniciar ou manter o sono e percecionamos o mesmo como reparador, não pensamos muito sobre isso. Qual seria o sentido de nos preocuparmos quando o nosso corpo já está a fazer aquilo que é suposto? Mas e quando temos problemas em dormir? Talvez faça sentido compreendermos qual é o papel dos nossos pensamentos e emoções difíceis na manutenção destes obstáculos.
A insónia, definida como um conjunto de dificuldades relacionadas com a qualidade, duração e/ou continuidade do sono, é uma das perturbações mais prevalentes entre as que estão relacionadas com o sono. Estima-se que um terço dos adultos reportem sintomatologia de insónia, sendo que 6% a 10% apresentem critérios para esta condição. A insónia associa-se a um conjunto de sintomas diurnos, como a fadiga, comprometimento cognitivo, ou alterações no humor; e mantém uma relação bidirecional com várias doenças físicas e psicológicas.
A Terapia cognitivo-comportamental, considerada o tratamento de primeira linha para a insónia, defende que a forma como gerimos pensamentos e emoções difíceis tem um impacto significativo nos comportamentos adotados para lidar com esta condição. Quando motivados por pensamentos geradores de sofrimento sobre nós mesmos, assim como sobre a nossa capacidade de enfrentar a insónia e as suas consequências, tendemos a optar por comportamentos que oferecem alívio a curto prazo, mas que podem contribuir para a manutenção ou agravamento do problema. Gera-se um ciclo vicioso em que quanto mais nos preocupamos com o facto de não conseguirmos dormir, maior é a nossa ativação fisiológica (decorrente de sintomas de ansiedade ou outras emoções difíceis) e mais nos esforçamos para “resolver” o problema: adotamos regras rígidas para o nosso comportamento; despendemos muito tempo a pensar sobre o problema (preocupando-nos com a noite futura e ruminando na noite que passou); e investimos em comportamentos ineficazes (ex. sestas, passar mais tempo na cama), estratégias estas que fazem com que dormir seja ainda mais difícil.
As novas abordagens da Terapia cognitivo-comportamental abordam diretamente a forma como lidamos com pensamentos e emoções difíceis. Competências chave destas abordagens, como a flexibilidade psicológica e a autocompaixão, permitem diminuir a reatividade emocional aos pensamentos e às emoções associadas à insónia, promovem uma maior aceitação e menor resistência ao estado de vigília e estimulam uma atitude mais autocompassiva com base na compreensão de que estas dificuldades são humanas e não o reflexo de uma falha ou inadequação pessoal. Assim, uma gestão eficaz da insónia engloba:
1. Estar presente e aberto ao que acontece na nossa mente e corpo (não lutando, evitando ou tentando modificar pensamentos ou emoções difíceis) através de práticas experienciais (ex. mindfulness e aceitação);
2. Compreender que as dificuldades relacionadas com o sono fazem parte da experiência humana, que a insónia é uma perturbação do sono que não escolhemos e que a autocrítica excessiva mantém o problema;
3. Investir o tempo acordados a agir de acordo com os nossos valores criando uma vida com sentido, mesmo que a insónia seja uma dificuldade.
Sobre o livro “STOP Insónia!”
Desenvolvido como um guia prático e acessível, o manual STOP Insónia! oferece um programa de desenvolvimento e treino de competências, com estratégias de autoajuda baseadas nas mais recentes descobertas científicas sobre o sono. É baseado na Terapia cognitivo-comportamental para a insónia e nas chamadas terapias de terceira geração, que incluem abordagens baseadas no Mindfulness, aceitação e compaixão.