Doentes e profissionais de saúde temem efeito da COVID-19 no agravamento da obesidade em Portugal
Amanhã, 23 de maio, assinala-se o Dia Nacional de Luta contra a Obesidade e a propósito desta data a Associação dos Obesos e Ex-Obesos de Portugal (ADEXO), a Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade (SPEO), Associação Portuguesa Contra a Obesidade Infantil (APCOI) e a Associação Portuguesa dos Bariátricos (APOBARI) lembram que a obesidade é uma doença que representa um fator de risco para desenvolvimento de complicações no contexto de infeção por COVID-19. Além disso, as três associações mostram-se preocupadas com o efeito que a quarentena e a suspensão de cirurgias e consultas possam vir a ter no agravamento da situação da obesidade em Portugal, uma vez que, segundo um estudo do Instituto Ricardo Jorge divulgado no início do ano, mais de metade (62%) dos portugueses são obesos ou pré-obesos.
Relativamente à COVID-19, a Federação Mundial da Obesidade (WOF) revela que as doenças relacionadas com a obesidade parecem piorar o efeito da infeção pelo novo coronavírus. Além disso, a pandemia atual pode contribuir para um aumento nas taxas de obesidade, já que os programas de perda de peso e intervenções cirúrgicas têm sido restringidos nas últimas semanas e é provável que as restrições continuem por mais algum tempo. O confinamento também tem impacto na mobilidade e pode levar à inatividade física forçada que, mesmo que por curtos períodos de tempo, aumenta o risco de doença metabólica.
Carlos Oliveira, presidente da ADEXO, considera que “é fundamental lembrar que, tal como a COVID-19, a obesidade também é um problema de saúde pública em Portugal e tem de ser tratada como tal. É urgente retomar cirurgias e consultas, olhar com seriedade para a necessidade de comparticipação do tratamento farmacológico e sobretudo promover os hábitos de vida saudáveis para que quem já tem excesso de peso não agrave o seu problema devido à pandemia”.
Paula Freitas, endocrinologista e presidente da SPEO reforça esta ideia e sublinha que “dado que em Portugal a prevalência de obesidade na população adulta tem vindo a aumentar e uma vez que o nosso país foi um dos primeiros a reconhecer a obesidade como uma doença, a SPEO gostaria de ver a obesidade a ser tratada como a patologia grave que é. É preciso um diagnóstico mais atempado e reencaminhamento dentro do sistema de saúde, apostar na promoção de uma melhor educação para a saúde e promoção correta da perda de peso. Existe também a necessidade de uma reestruturação dos programas de tratamento existentes no nosso país. Há que dotar os profissionais de saúde dos Cuidados de Saúde Primários de conhecimentos sobre o tratamento global da obesidade, mas também de meios físicos e económicos. E todas estas medidas são particularmente importantes neste contexto de pandemia que vivemos hoje”.
Os dados sobre o impacto da pandemia na obesidade infantil em Portugal ainda não estão disponíveis, mas as previsões da APCOI não são muito positivas: estima-se que o confinamento tenha um impacto direto no peso corporal das crianças que se poderá traduzir num aumento médio de 10%. Mário Silva, Presidente da APCOI refere ainda que “vários estudos científicos anteriores à pandemia já tinham demonstrado haver aumento de peso durante os períodos de férias escolares, principalmente entre as crianças que já tinham excesso de peso e obesidade”. De acordo com os cálculos realizados pela APCOI, se cada criança por dia tiver ingerido em média cerca de 200-300 calorias extra (por exemplo, através do consumo adicional de algumas fatias de bolo ou bolachas), sem ter aumentado na mesma proporção o seu gasto energético diário através de atividade física, isso significa que nos últimos dois meses, aproximadamente terão sido acumuladas 12.000 a 18.000 kcal a mais, o que corresponde a um aumento de peso de pelo menos 2 kg”.
Já Marisa Oliveira, presidente da APOBARI, mostra a sua preocupação relativamente ao acesso às cirurgias uma vez que estas contribuem para tratar muitos casos de forma quase definitiva: “graças à cirurgia bariátrica controlamos a obesidade e deixamos de sofrer de inúmeras comorbilidades associadas à doença. Adquirimos uma melhor qualidade de vida e deixamos de ser grupo de risco. É por isso que mesmo durante a pandemia é preciso continuar a tratar cirurgicamente as pessoas com obesidade, pois além de estarmos a tratar esta doença, estamos também a diminuir o risco de complicações em caso de infeção por COVID-19”.
Além do risco de complicações em caso de infeção por COVID-19, a obesidade tem um enorme impacto na saúde, estando associada a mais de 200 outras doenças, como diabetes, dislipidemia, hipertensão arterial, apneia do sono, síndrome metabólica, doenças cardiovasculares, incontinência urinária, e cerca de 13 tipos de cancros, sendo ainda responsável por alterações musculoesqueléticas, infertilidade, depressão, diminuição da qualidade de vida e mortalidade aumentada, o que faz com que represente também um grande “fardo” do ponto de vista económico, pelos seus custos diretos e indiretos.
Segundo Carlos Oliveira da Adexo não é a obesidade que está associada às doenças cardiovasculares, não é a obesidade que está associada à diabetes, não é a obesidade que está associada às doenças respiratórias e apneia do sono. É a obesidade que provoca e acelera todas estas doenças e se é assim porque razão não é considerada uma doença com tratamento prioritário?
Esta doença complexa e multifatorial é um dos principais problemas do século XXI, tendo já atingido proporções epidémicas. É por isso que neste dia Nacional de Luta contra a Obesidade ADEXO, APOBARI e APCOI pedem às pessoas com obesidade que sigam à risca todas as regras de distanciamento social e higiene respiratória para evitar a infeção por coronavírus e apelam ao Ministério da Saúde para que o tratamento e prevenção da obesidade não sejam colocados em segundo plano.