Combater a perda de audição com uma intervenção precoce
No âmbito do Dia Mundial da Audição, que se comemora amanhã, dia 3 de março, partilhamos um artigo de opinião de Pedro Alberto Escada, vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Otorrinolaringologia e Cirurgia da Cabeça e Pescoço.
O Dia Mundial da Audição comemora-se desde há vários anos a 3 de Março. Em 2020 a comemoração pretende chamar a atenção, em especial, para a necessidade de uma intervenção precoce para combater a perda de audição, por medidas que incluem as próteses auditivas.
Uma audição normal ou corrigida é essencial para que possamos comunicar com os outros, dentro das nossas comunidades e com o mundo em geral. A intervenção precoce e atempada na perda de audição é essencial para um acesso pleno à educação, ao emprego e à comunicação na comunidade.
Em Portugal, tal como no resto do mundo, muitas das pessoas com perda de audição e handicap significativo na comunicação não estão alertadas para a sua incapacidade e as suas consequências, não procuram a ajuda profissional especializada que necessitam (um médico de otorrinolaringologia), e não têm, muitas vezes, acesso aos tratamentos ou meios de reabilitação necessários, dos quais as próteses auditivas são a forma de reabilitação mais vezes recomendada.
Portugal tem ainda a desvantagem de ser um país envelhecido, no qual a perda de audição relacionada com a idade (presbiacusia) é muito frequente: um quarto da população portuguesa tem mais de 65 anos e um terço das pessoas com mais de 65 anos tem uma perda de audição que lhe causa um handicap significativo na comunicação. Em termos gerais serão 800 mil indivíduos. Sabe-se atualmente que a perda de audição do idoso, não corrigida, facilita também a progressão mais rápida de défices cognitivos (tais como a doença de Alzheimer), o isolamento e a depressão.
O objetivo de reabilitar atempadamente todas as pessoas idosas com perda de audição significativa em Portugal esbarra em várias dificuldades:
- A perda de audição é muitas vezes desvalorizada pelo indivíduo surdo ou pelas suas famílias.
- O médico generalista (médico de família) ainda não está suficientemente alertado para ter que inquirir ativamente os seus pacientes idosos e as suas famílias sobre a perda de audição e as suas consequências (isolamento, depressão, alterações da cognição) em vez de só valorizar as queixas de perda de audição que possam ser manifestadas pelos seus pacientes.
- Os idosos com perda de audição não procuram ou não são referenciados para a ajuda especializada mais correta, que deve iniciar-se sempre por uma consulta médica de otorrinolaringologia.
- Não existe um sistema de comparticipação ou financiamento das próteses auditivas por parte do Serviço nacional de Saúde que garanta a equidade: só as pessoas com maior capacidade económica têm geralmente acesso a próteses auditivas adequadas.
- Algumas casas de próteses têm uma estratégia de marketing muito agressiva utilizando publicidade excessiva e meios ilegais no acesso aos dados pessoais das pessoas de idade. Essas pessoas são depois contactadas com promessas de exames grátis e próteses auditivas muito baratas, e acabam por comprar próteses auditivas por milhares de euros, que os doentes não conseguem devolver, mesmo quando os resultados prometidos não são alcançados.
Vamos esperar que o Dia Mundial de Audição de 2020 seja útil para que estes problemas sejam reconhecidos e debatidos e sejam planeadas estratégias para os corrigir, para que brevemente tenhamos em Portugal mais idosos com a sua perda de audição corrigida, menos isolados, mais felizes e mais úteis para as suas famílias e a sociedade.