Área Reservada

“Desafios do médico de família na abordagem das doenças respiratórias são cada vez maiores”

“Desafios do médico de família na abordagem das doenças respiratórias são cada vez maiores”

Nos próximos dias 21 e 22 de abril, Coimbra recebe as 4as Jornadas do Grupo de Estudos de Doenças Respiratórias (GRESP) da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar. Numa breve antevisão do evento, Rui Costa, coordenador do GRESP, revela alguns dos temas que estarão em debate e sublinha o papel cada vez mais exigente dos médicos de família na abordagem das patologias respiratórias, sobretudo as crónicas.

 

Raio-X (RX) – Cuidar, capacitar e acompanhar é o tema destas jornadas. É em torno destas três ações que gira o papel do médico de família que trata o doente com patologia respiratória?

Rui Costa (RC) – Estas três ações são a base em que assenta a prestação de cuidados de saúde em geral do Médico de Família, na sua prática clínica diária, os quais são também aplicados à gestão da doença na área respiratória.

A escolha do lema está diretamente relacionada com três principais tarefas e desafios desempenhados pela equipa de saúde, composta pelo especialista de Medicina Geral e Familiar (MGF) e enfermeiro de família, aos doentes respiratórios que são diariamente assistidos nas diferentes unidades de cuidados de saúde primários a nível nacional. Para a melhor prestação de cuidados de saúde aos doentes respiratórios é essencial diagnosticar e tratar corretamente as múltiplas doenças respiratórias agudas e crónicas, a sua capacitação para compreenderem e saberem lidar com a sua doença respiratória crónica e acompanhar adequadamente, ao longo da vida os doentes portadores de doenças respiratórias crónicas, de forma a responder às suas necessidades de saúde e de controlo da doença, contribuindo para uma melhor qualidade de vida.

 

RX – No âmbito da MGF tem vindo a ser alargada a área de intervenção no doente respiratório. A par da identificação e diagnóstico deste tipo de doenças, o médico de família tem agora um papel terapêutico mais exigente. Quais os principais desafios no acompanhamento destes doentes?

RC – Os desafios que o Médico de Família tem na abordagem e gestão das doenças respiratórias, nomeadamente nas doenças crónicas, são cada vez maiores e requerem uma grande capacidade formativa, de atualização constante de conhecimentos e de abertura à mudança nos processos e nas atitudes clínicas. Ao médico de família é exigida uma maior capacitação para identificar, diagnosticar e tratar atempada e eficazmente as múltiplas doenças respiratórias crónicas, assim como uma maior responsabilidade e delegação de competências no acompanhamento e seguimento destes doentes ao longo do tempo e por períodos prolongados, fruto do aumento da longevidade da população. Estas doenças são cada vez mais frequentes ao nível dos cuidados de saúde primários e o médico de família tem de ter os conhecimentos e competências necessários para lidar adequadamente com estas doenças e prestar os melhores cuidados de saúde de proximidade e continuidade, com a adoção de atuações terapêuticas custo-efetivas aos doentes respiratórios.

 

RX – Quais os desafios, a nível nacional, no que respeita a este conjunto de doenças?

RC – Os principais desafios que se colocam presentemente na área das doenças respiratórias em Portugal são a melhoria da saúde respiratória global dos portugueses, assente na prestação de cuidados de saúde personalizados e continuados suportados por uma rede de equipas multiprofissionais adequadamente articulada e de proximidade. Para isso, é fundamental investir na educação para a saúde respiratória e na prevenção adequada, através do melhor controlo dos fatores de risco, tais como do consumo de tabaco, nomeadamente na população jovem, e a melhor cobertura vacinal antigripal e antipneumocócica da população. É igualmente desejável estimular e continuar a apostar na formação contínua, para conseguimos uma mais eficiente abordagem das doenças respiratórias por todos os profissionais de saúde e especialmente pelos Médicos de Família, no diagnóstico, tratamento e monitorização dos doentes com patologia respiratória, com vista ao melhor controlo destas doenças, à diminuição dos internamentos, dos custos de saúde, da perda de anos de vida e da mortalidade associada às doenças respiratórias. Temos também como grande desafio, no âmbito do diagnóstico e acompanhamento das doenças respiratórias crónicas, o acesso atempado por todos os Médicos de Família, independentemente da área geográfica, a uma rede nacional de espirometria de qualidade. Outro aspeto crítico, onde muito ainda há por fazer, é na oferta nacional de uma adequada rede de cuidados de reabilitação respiratória.

 

Articulação entre especialidades

 

RX – Em que momento é que o édico de Família deve referenciar um doente para a consulta hospitalar de especialidade?

RC – A referenciação para outras especialidades médicas deve ser realizada sempre que a situação clínica seja de difícil diagnóstico ou controlo terapêutico, ou sempre que surjam complicações, ou a gravidade clínica assim o justifique. A articulação de cuidados e a abordagem multidisciplinar é desejável, necessária e essencial para a melhor prestação de cuidados e para a obtenção do melhor resultado de saúde para o doente respiratório.

A continuidade assistencial, a articulação e coordenação entre os diferentes níveis de cuidados de saúde, com a utilização das novas tecnologias e plataformas informáticas são fundamentais para a prestação de cuidados de saúde efetivos e de qualidade, onde o médico de família tem um papel integrador essencial.

 

RX – É fácil a articulação entre a Medicina Geral e Familiar e os cuidados hospitalares, nomeadamente ao nível da Pneumologia?

RC – De uma forma geral, e dependendo de características ou variações regionais, independentemente das limitações de recursos locais, a articulação entre a MGF e a Pneumologia é fácil, continua e profícua.

Sabemos que em muitas regiões do país já existem excelentes experiências de articulação entre os CSP e os Serviços de Pneumologia, mas importa continuar a fomentar e estimular a melhor articulação regional com base nas necessidades locais e nas boas experiências existentes a nível nacional.

 

RX – No conjunto das várias doenças respiratórias, quais as que, do ponto de vista epidemiológico, têm vindo a ter mais expressão no âmbito dos cuidados de saúde primários?

RC – De uma forma geral, quase todas as doenças respiratórias têm vindo a ter maior expressão ao nível dos CSP e, na atualidade, as doenças respiratórias já constituem a terceira causa de morte por doenças crónicas não transmissíveis. As doenças respiratórias agudas mais comuns na comunidade são as infeções do trato respiratório superior, a gripe, as bronquites e as pneumonias adquiridas da comunidade. Nas doenças respiratórias crónicas, destacamos o aumento da prevalência da rinite, da asma, da DPOC, da SAOS, das neoplasias do aparelho respiratório, da tuberculose, das bronquiectasias e do tabagismo. No entanto, outras doenças mais raras têm vindo a aumentar a sua prevalência, tais como as doenças do interstício, a fibrose pulmonar, a fibrose cística, a doença vascular pulmonar e as doenças respiratórias ocupacionais.

 

4as Jornadas do GRESP

 

RX – Quais os principais temas em debate nesta 4.ª edição das Jornadas do GRESP?

RC – Os principais temas em debate nas 4as Jornadas do GRESP são: a investigação em cuidados de saúde primários, a doença alérgica na consulta de MGF, a sobreposição Asma/DPOC, a desabituação tabágica, a patologia respiratória e doença profissional, o cancro do pulmão, o estado da arte na Asma e DPOC e a doença intersticial do pulmão. Existirão também várias oficinas de carácter eminentemente prático, interativo e útil sobre espirometria, inaladores, cuidados respiratórios domiciliários, rinossinusite, reabilitação respiratória em CSP, imagiologia respiratória e um inovador curso intensivo de cuidados respiratórios em enfermagem.

 

Por Cátia Jorge